segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Um ano após tragédia na Kiss, lei nacional ainda não saiu do papel

Globo.com
Um ano após tragédia na Kiss, lei nacional ainda não saiu do papel
A tragédia na boate Kiss, em Santa Maria, alertou para a necessidade de aprimorar a legislação de prevenção a incêndios e reforçar a fiscalização sobres casas noturnas, bares e similares. Um ano depois, no entanto, a lei nacional prometida pelos deputados para unificar as normas de segurança em todo o país ainda não foi votada.
Mesmo a nova legislação do Rio Grande do Sul, aprovada na Assembleia Legislativa e sancionada pelo governador no final de dezembro, ainda depende de regulamentação e pode levar meses até que seja aplicada na prática. Enquanto isso, nada impede que a sucessão de falhas que deixou um saldo de 242 mortos em Santa Maria se repita em outro lugar.
Nos dias seguintes ao incêndio, a Câmara dos Deputados anunciou a criação de uma Comissão Externa para acompanhar os desdobramentos da tragédia e apresentar uma proposta legislativa sobre o tema. Mas a mobilização inicial dos parlamentares perdeu força ao longo dos meses. Concluído em junho passado, o projeto de lei aguarda há mais de sete meses para ser levado à votação em plenário.
De acordo com o deputado Paulo Pimenta (PT-RS), que coordenou a comissão, outras proposições consideradas prioritárias passaram à frente da pauta de votações, como o programa Mais Médicos, a minirreforma eleitoral e o Marco Civil da Internet. Mas também faltou sensibilidade dos deputados para o tema, na avaliação do parlamentar. 
“Tivemos um semestre difícil, mas acho que o motivo principal (para a demora) é que talvez o impacto do que aconteceu seja diretamente proporcional à proximidade das pessoas com o fato. Eu, como morador de Santa Maria, convivo muito com a tragédia, mas para outros deputados há um certo distanciamento. E talvez isso efetivamente tenha feito com que a Casa não tenha compreendido a importância de que tivéssemos completado um ano da tragédia já com uma nova legislação em vigor no país”, justifica.
Pimenta diz que o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), assumiu o compromisso de que o projeto será votado em fevereiro, na volta do recesso parlamentar, e que já há acordo de líderes de bancada para aprovação. O deputado federal também afirma que senadores do Rio Grande do Sul e de outros estados prometeram analisar rapidamente a proposta, que depois ainda passará pela sanção presidencial.
Entre outras normas, o texto define as responsabilidades de bombeiros e agentes públicos na fiscalização dos estabelecimentos, prevê a criminalização da superlotação em casas noturnas e similares e extingue o sistema de pagamento com comandas, todos fatores que contribuíram para o horror de Santa Maria. Estados e municípios continuarão a ter suas próprias leis próprias, mas terão que adaptá-las às normas e exigências da lei federal.
"O projeto enfrenta principamente a questão de impunidade, essa dificuldade que a gente tem hoje de saber com clareza quem foram os responsáveis, esse verdadeiro jogo de empurra que existe no poder público. Define com clareza a responsabilidade da prefeitura, dos bombeiros, dos proprietários, dos técnicos que aprovam projetos e estabelece um padrão mínimo de exigência que deve ser observado em todo o Brasil", diz Pimenta.
Lei estadual espera regulamentação e dará mais autonomia a bombeiros
Também formulada por uma Comissão Especial, a nova lei estadual de prevenção a incêndios foi aprovada em 11 de dezembro e sancionada pelo governador Tarso Genro no dia 26 do mesmo mês. As novas normas estão em vigor desde então, mas para serem aplicadas de fato ainda dependem da regulamentação, que vai definir prazos para cumprimento, valor de multas e sanções, entre outros itens.
De acordo com o deputado Adão Villaverde (PT), presidente da comissão e autor da proposta, o Executivo se comprometeu a publicar o decreto regulamentar ainda no primeiro semestre. Procurada pela reportagem para comentar o assunto, a assessoria de imprensa da Casa Civil não respondeu aos questionamentos.
A regulamentação depende da criação de um conselho estadual formado por entidades relacionadas à prevenção de incêndios, como Corpo de Bombeiros, Conselho de Engenharia e Agronomia (Crea) e Conselho de Arquitetura e Urbanismo (Cau), entre outras. Essa conselho irá detalhas como a lei será aplicada e também terá um papel normativo, consultivo e atualizador da legislação, mas ainda não foi criado.
O comandante do Corpo de Bombeiros do estado, coronel Eviltom Pereira Diaz, diz que comissões internas foram formadas em todos os comandos regionais para elaborar as normas técnicas que darão subsídios à lei, além de outras sugestões da corporação. Esse trabalho, iniciado no começo de janeiro, deve se encerrado até o final da semana.
Entre as principais novidades da nova lei gaúcha estão a ampliação do número de itens obrigatórios a serem considerados na elaboração do Plano de Prevenção e Proteção Contra Incêndio (PPCI), a exigência de brigadistas treinados no combate a incêndios em locais com 200 ou mais pessoas e a exigência do alvará dos bombeiros para funcionamento do imóvel.
Uma das maiores críticas dos bombeiros à legislação anterior era de que ela não permitia que a boate Kiss, por exemplo, fosse interditada. Na nova versão, os bombeiros terão amplos poderes de interdição e também poderão contar com um quadro técnico de especialistas para atuar na fiscalização, que não necessitará de vínculo com a Brigada Militar.
“O nível de exigência da nova lei é infinitamente superior à legislação anterior. Não haverá autorização de funcionamento de qualquer edificação sem o alvará de prevenção contra incêndio. Sob a nova legislação, a Kiss estaria fechada, a tragédia seria evitada. Se o bombeiro detectou que na edificação não há o cumprimento do que foi exigido, ele pode chegar lá e fazer a interdição”, diz o deputado Villaverde.

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